sexta-feira, 25 de junho de 2010

ARROGÂNCIA...


Em ‘Sobre Demônios e Pecados’, Rubem Alves fala que há demônios especializados num tipo de feiúra chamado “ridículo”. O arrogante se acha lindo. Somente aqueles que o vêem se dão conta de seu ridículo.

É o caso do vaidoso. Ele se acha o mais bonito, o mais inteligente, o mais interessante. Deseja aparecer. Pavão. Abre o rabo de penas coloridas e fica esperando a admiração dos que o veem. Julga-se, em qualquer lugar, o centro da atenção admiradora de todos. Os mais bobos falam sem parar, julgando que suas palavras são poemas. Não percebem que os outros estão dizendo: “Você é um chato!”

A arrogância assume várias formas. Numa extremidade está a arrogância narcísica. Você conhece o mito de Narciso. Jovem lindo, o mais lindo de todos, apaixonou-se pela própria imagem refletida no espelho d’água de uma fonte. Sua beleza o fascinou de tal forma que tudo o mais perdeu o interesse. Nada no mundo podia se comparar à sua beleza. Incapaz de ver beleza fora de sim mesmo, ele se tornou prisioneiro da própria imagem. Ficou paralisado à beira da fonte e morreu, transformando-se então na flor que leva seu nome.

O mundo está cheio de Narcisos. Você deve conhecer aquelas pessoas que, quando a gente conta uma coisa, não demonstram o menor interesse e vão logo dizendo: “Mas isso não é nada...” E com essas palavras jogam no lixo o que a gente falou e passam a falar sobre a única coisa que realmente importa: elas mesmas.

Na outra extremidade está a arrogância violenta, que acontece quando o Narciso, além de convencimento, tem poder. Tendo poder, ele se impõe. Claro. Convencido de sua beleza, ele acredita que suas idéias são as únicas certas. As idéias de todos os outros têm de estar erradas. Ele não pode admitir que outros possam estar certos. Porque isso seria admitir que os outros têm uma beleza que ele não possui. Se ele for somente um Narciso sem poder, sua feiúra aparece apenas na chatice de que todos fogem. Mas, se ele tem poder – se é presidente, ou diretor de uma escola, ou chefe de departamento, ou delegado, ou oficial do exército, ou campeão de artes marciais, ou professor, ou pai, mãe –, não titubeia em lançar mão de seu poder para fazer valer a superioridade que acredita possuir. Aí a arrogância se revela como violência. Quanto ao arrogante narcísico, todos riem dele. Quanto ao arrogante violento, todos riem dele e desejam sua morte.

A arrogância está intimamente ligada à vaidade. A palavra ‘vaidade’ vem do latim vanus, que quer dizer “vão”. Vaidade, assim, é vazio, o sem conteúdo, o sem valor. O arrogante está possuído pela vaidade. Vi um lagarto arrogante. Insignificante se não se percebia visto, quando queria impressionar os outros ele estufava um saco vermelho que havia no pescoço. Ficava, de fato, impressionante e amedrontador. Mas seu papo vermelho era vanus – estava cheio de ar. Assim são os arrogantes.

Pois é!
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("Sobre Demônios e Pecados - Rubem Alves - Ed. Verus)

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